Estamos em Dezembro de 1999, há 25 anos, portanto. O ‘hall’ da Rádio Nacional de Angola (RNA), nas actuais instalações, na Maianga, testemunha o surgimento, debaixo de enorme expectativa, da primeira revista de especialidade económica do País - a Economia & Mercado.
A cerimónia está repleta de gente influente, da classe política ao segmento empresarial; e um rosto a representar a Igreja em Angola: justamente, Dom Alexandre do Nascimento, já feito Cardeal há 16 anos.
Aos 74 anos, partilha a ‘tribuna’ de convidados com figuras como Lúcio Lara, então membro do Bureau Político e, à época, secretário-geral do MPLA; a actual Primeira-Dama, Ana Dias Lourenço, nas vestes de ministra do Planeamento, e Joaquim David, nessa altura, titular da pasta da Indústria.
Nuno Fernandes, PCE do Grupo Executive, empresa à qual a revista Economia & Mercado está associada através da Edicenter Publicações, é um dos anfitriões do acto, e recorda a “presença extremamente marcante”, há 25 anos, do primeiro e único Cardeal angolano na cerimónia.
“O Cardeal Alexandre do Nascimento foi sempre uma pessoa muito atenta aos problemas do desenvolvimento do País. E, em algumas intervenções públicas que fez, era um homem que desejava uma economia que zelasse e elevasse o nível de vida dos cidadãos”, descreve as razões do convite formulado a uma das mais importantes figuras da história da Igreja Católica em Angola.
Acrescenta que a “preocupação social” de Dom Alexandre do Nascimento, “que não deixa de ser, também, de ordem económica”, fez com que os proprietários da revista quisessem tê-lo na cerimónia em que a revista E&M se ‘deu’ a conhecer ao público.
Nuno Fernandes recorda que o Cardeal “aceitou de extraordinário bom grado” o convite, e fez questão de ser “das pessoas mais pontuais” no evento: “Inclusivamente, lembro-me que estava na primeira linha, logo nas primeiras cadeiras. Foi muito interessante e extremamente marcante”.
E mais memórias descritas com tom e semblante que revelam gratidão: “Termos a presença do nosso digno Cardeal numa cerimónia de lançamento de uma revista, a primeira, digamos, de especialidade que o País editava, foi, para mim, se calhar, um sinal de que esta revista iria ter um bom caminho, (...) ele acreditou que o projecto era sério, quis dar uma mostra de confiança e de credibilidade. Isso caiu-nos profundamente bem. E, hoje, 25 anos depois, pela nossa prática, acho que merecemos esta confiança”.
Ligados, antes, pela TAAG
Nuno Fernandes guarda na memória outros momentos de interacção com o Cardeal Dom Alexandre do Nascimento. A vinda a Angola do Papa João Paulo II, em 1992, faz parte, igualmente, desses registos.
Foi nas vestes de responsável pela comunicação da TAAG - Linhas Aéreas de Angola que o agora PCE da Executive teve as primeiras interacções com a figura do primeiro e único Cardeal angolano, isto na agenda da inédita recepção do líder da Igreja Católica.
“Acabei por conviver muito com ele na vinda do Papa João Paulo II; onde, também, estive na comissão de organização da viagem. Na altura, estava à frente da área de comunicação da TAAG, que foi responsável pelo transporte do Papa não só em Angola, mas para São Tomé, e, depois, também, para Roma”, recorda.
E detalha o sentimento de ter vivido aqueles momentos com o Cardeal: “Convivi com ele durante todo este processo, e tenho uma dimensão muito próxima do valor, do peso, da influência e da grandiosidade de Dom Alexandre do Nascimento”.
“Uma honra muito grande para um país poder ter na sua história um homem assim”
O Cardeal Dom Alexandre do Nascimento morreu no último sábado, 28, em Luanda, aos 99 anos, vítima de doença. O seu sepultamento está marcado para a próxima terça-feira, 08, na Sé Catedral, na capital do País.
Nuno Fernandes, PCE do Grupo Executive, refere que o País perdeu “um enorme exemplo, uma grande referência moral, de honestidade e de verticalidade”.
Recorda a figura nacionalista do Cardeal e a sua entrega, desde muito cedo, às causas da libertação nacional, da dignidade do angolano, não sendo por acaso que, a determinada altura, “se falava, inclusivamente, da viabilidade da sua candidatura ao cargo de Presidente da República, e isso porque, noutras paragens no mundo, pessoas desta natureza quase que foram chamadas a cargos deste tipo”.
Sublinha o facto de Dom Alexandre do Nascimento ter sido o único Cardeal angolano: “Repare que, independentemente de termos dito pessoas de grande valor a nível da igreja [Católica em Angola], nós, no nosso País, só tivemos um Cardeal, e isto diz alguma coisa”.
Nuno Fernandes vaticina que, com a partida do Cardeal angolano, eventualmente muitas outras coisas que Dom Alexandre do Nascimento julgava “serem pessoais” deverão ser reveladas sobre a “grandiosidade” do seu legado.
“Acho uma honra muito grande para um país poder ter na sua história um homem assim”, conclui.