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PATROCINADO

O Mercado da Saúde 
e os medicamentos contrafeitos

José Gualberto Matos
29/8/2019
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Foto:
Carlos Aguiar

Metade dos medicamentos que circulam no país são contrafeitos – quem o afirma é o próprio Governo. Uma notícia que preocupa qualquer cidadão mais atento. Como foi possível chegar a este ponto?

Só pode ser o resultado da ténue presença do Estado num sector crucial. Por isso, retomo uma matéria que já aqui abordei anteriormente: a regulação do mercado da saúde. Não basta desmantelar os locais de venda ilegal de medicamentos – isso é um mero acto de polícia. É preciso atacar o problema de fundo: o preço dos medicamentos. A grande maioria da população não tem poder de compra para adquirir medicamentos no mercado formal, onde os preços continuam muito altos. Quem o reconheceu foi também o próprio Governo,que, em Fevereiro de 2015, concluiu que o país tem os preços mais altos daÁfrica Austral e anunciou a criação de uma comissão de regulação de preços dos produtos farmacêuticos. Já em Agosto de 2010 fora constituída a ComissãoNacional de Regulação de Preços de Produtos Farmacêuticos, com o objectivo de reformar a legislação relativa aos preços destes produtos, incluindo as regras e fórmulas a aplicar para o cálculo dos preços de venda ao público. Estas medidas não surtiram efeito relevante, porque o preço médio de venda ao público dos medicamentos continua a ser o dobro, e por vezes o triplo, do preço praticado na Europa ou na África do Sul.

O Estado não terá tido força suficiente para enfrentar aquilo que parece ser um oligopólio associado à importação de medicamentos, que pode também ser a força que inviabiliza o fabrico local de medicamentos básicos. Esperemos que a futura autoridade da concorrência tenha como prioridade ordenar o mercado dos medicamentos e que, em simultâneo, o Executivo retome a agenda de produzir em Angola os medicamentos básicos. Não importa muito como e com quem. O importante é produzir os medicamentos básicos emAngola, porque isso ajuda a combater o lóbi da importação, ajuda na balança de pagamentos em moeda externa e cria emprego. E é minha convicção que, face às margens praticadas hoje, a produção local é viável. Mas na equação dessa viabilidade, tem de entrar o interesse público, que em última instância consiste em colocar no mercado medicamentos devidamente certificados a preços módicos.
A evolução da economia angolana, de um sistema centralizado para uma economia liberal, levou muito boa gente a pensar que o mercado era a solução para tudo.Mas o mercado não aparece do nada. É preciso criar todo um ecossistema que permita o surgimento de actores que irão formar o mercado. É por isso inevitável uma economia de transição, em que o Estado vá reduzindo paulatinamente a sua presença do mercado. Não o pode fazer de forma abrupta.

O mercado da saúde configura um caso típico de falha de mercado. De facto, este mercado caracteriza-se pela figura do consumidor substituto, porquanto é quase sempre o médico ou o paramédico quem prescreve o medicamento ou o serviço, num quadro de forte assimetria de informação (o consumidor sabe pouco sobre a matéria em comparação com o prescritor). Acresce que estes produtos e serviços são essenciais à segurança sanitária e à vida das populações. Por isso, o mercado da saúde precisa de regulação robusta e independente, que mitigue as falhas de mercado e proteja o interesse público.

Leia mais na edição de Setembro de 2018.

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