Após terem cumprido as suas penas, lutam contra o julgamento “preconceituoso” da sociedade e tentam recuperar o tempo perdido.
Há quase dez anos, Zeferino Ganga, também conhecido por “Pára-choque”, entre os mais próximos, foi condenado a 18 anos de prisão maior pelo Tribunal Provincial de Luanda, pelo homicídio de um pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD). A vítima era um seu parente.
Segundo relatos de testemunhas oculares, tudo começou quando o malogrado recebeu uma notificação da parte de um parente a convocá-lo, na qualidade de tio mais velho, para uma reunião onde se pretendia dirimir um “mal-estar” que afligia a família. Mas a reunião não correu como se esperava. Houve tumultos, agitaram-se as emoções e o descontrolo dos presentes foi inevitável.
Entre outros inconformados com o desfecho da reunião estava “Pára-choque”, considerado o principal culpado do sucedido. Em entrevista à Economia & Mercado o jovem reafirmou que o homicídio não foi premeditado. “Foi um acidente”, recordou, acrescentado que o sucedido mudou completamente o curso da sua vida. Aliás, além de dividir opiniões, a morte da entidade eclesiástica também separou famílias.
“Pára-choque” lembra-se das consequências desastrosas da sua acção, sendo que hoje, passados 10 anos, no seio da família ainda se sente a dor das feridas que parecem impossíveis de cicatrizar. “Alguns familiar estiveram de abandonar a residência. Até na Igreja houve divisão. A situação abalou muita gente, por isso não gosto falar deste assunto”, disse, completamente desanimado.
Já no Kwanza Sul, uma outra história se parece com a de “Pára-choque”. Fernando Sabalo, natural do município da Quibala, foi considerado culpado da morte de uma anciã com a qual se envolvia em constantes conflitos baseados em superstições. Segundo o acusado, a malograda ter-se-á desentendido consigo, na altura com apenas 19 anos de idade, depois de ter sido acusada de prática de feitiçaria com a finalidade de afectar a família de Fernando.
De uma simples troca de palavras, passou-se à agressão,que resultou na queda da porta da casa da vítima, causando-lhe um ferimento grave na parte frontal da cabeça. Infelizmente, a anciã não resistiu aos ferimentos e acabou por falecer. Pelo ocorrido, o jovem, que hoje reside algures do Distrito Urbano do Zango, cumpriu 12 anos de prisão, uma parte deles na Comarca do Sumbe, onde se destacou por boa conduta, e outra parte em Luanda. Mas, cumprida a pena, que futuro espera os antigos reclusos? Em muitos casos,segundo fontes da E&M, esses são atirados para o desemprego e muitas vezes são rejeitados pela própria família.
De acordo com Carlos Vaguy, assessor de direcção do Grupo Diside – empresa que detém um aglomerado de unidades fabris no Kikuxi –, a ausência de acompanhamento profissional e psicossocial dificulta a reintegração dos ex-reclusos. E é por esta razão que a Diside tem firmado protocolos de cooperação com o Ministérios da Justiça e com os Serviços Prisionais na área da reintegração de reclusos e ex-reclusos.
“Cá dentro tratamo-los como colaboradores normais, porque para nós não são reclusos, são funcionários na plenitude dos seus direitos e deveres e recebem todos as benesses normais como qualquer outro funcionário”, revelou, acrescentando que não têm tido queixas em relação ao comportamento dos beneficiários desse programa.
“Temos colaboradores com cadastro criminal que desempenham cargos de chefia, de alta responsabilidade”, referiu o gestor. Dois dos vários exemplos vivos do papel do sector privado na mitigação de problemas sociais, enquanto parceiros estratégicos do Estado, são Daniel Samuxuko e Fernando Sabalo. Ambos terminaram as penas trabalhando de forma remunerada para a Fazenda Pérola do Kikuxi, onde reconstruíram a vida mesmo depois de 10 anos privados de liberdade.
Natural da província do Moxico, Daniel Samuxuko, ex-militar, cumpriu 16 anos de prisão maior por ter alvejado mortalmente um cidadão civil. “Não foi minha intenção matar”, garantiu o jovem.
Leia mais na edição de Março de 2020
Economia & Mercado – Quem lê, sabe mais!