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Covid-19 veio amplificar os sintomas recessivos da economia angolana, afirma economista

Sebastião Vemba
6/5/2020
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Foto:
DR

Segundo Carlos Lopes, “a generalidade dos negócios do sector informal confronta-se com uma redução de clientes por causa da pandemia".

A pandemia da Covid-19 “veio amplificar os sintomas recessivos que a economia angolana tem vindo a apresentar e que se agravaram pela tendência decrescente do preço do barril de petróleo”, afirmou, numa análise enviada à Economia & Mercado, o economista Carlos Lopes.

Segundo a fonte, internamente, já se regista o impacto negativo no sector dos petróleos, nomeadamente uma redução da procura “em função das exigências de não exposição ao virus e das alterações no comportamento dos consumidores daí resultantes”. Ademais, acrescentou,  “sectores como o petrolífero, a indústria transformadora, os transportes e logística, o comércio a retalho, a hotelaria e restauração, que são mais vulneráveis aos efeitos da redução da procura global e do distanciamento social, estão já a sofrer o impacto da crise da pandemia, sendo expectáveis a contracção do PIB, o aumento do déficit público, o aumento do desemprego, a desvalorização cambial e o aumento da taxa de inflação”.

Na análise intitulada “A pandemia COVID-19, as implicações do Estado de Emergência e os efeitos imediatos sobre actividades informais em Angola: uma leitura preliminar”, Carlos Lopes, também docente do Instituto Superior Politécnico de Tecnologias e Ciências (ISPTEC) e pesquisador   do Centro de Estudos de Ciências Jurídico-Económicas e Sociais (CEJES) da Universidade Agostinho Neto (UAN), afirma que “mesmo nos países mais desenvolvidos e estruturados tem cabido ao Estado a assumpção da responsabilidade primacial na resposta política ao contexto de crise, mobilizando os instrumentos da política orçamental para reforçar os recursos no sector da saúde, para aumentar os apoios sociais para grupos mais vulneráveis e  providenciar suporte temporário a empresas com dificuldades financeiras, com o objectivo de restaurar a confiança dos cidadãos, consumidores e empresas na economia”. Entretanto, prossegue, “em Angola, onde as instituições são frágeis, onde o Estado está descapitalizado e endividado, onde a maioria da população, pobre e vulnerável, sobrevive sem mecanismos de protecção institucional num ambiente de elevada incerteza e volatilidade e em que a informação é imperfeita, o que vale por dizer que é, muitas vezes, escassa e de qualidade duvidosa, as opções dos decisores económicos ficam bastante mais condicionadas. Mas as decisões não deixam de ser tomadas e delas, resultam sacríficos diferenciados para diferentes grupos sociais e económicos. E, invariavelmente, quem sai a perder são os pobres e os que sobrevivem na economia informal”.

De acordo com o pesquisador, em termos de efeitos imediatos da pandemia da Covid-19 sobre as actividades e rendimentos informais, está “a paralisação total de algumas actividades, como é o caso dos mototaxistas (que em Angola é a ocupação produtiva de muitas dezenas de jovens) e dos comerciantes que negoceiam no comércio transfronteiriço. O que também sucede com alguns dos comerciantes de alguns dos mercados que foram encerrados e que não têm possibilidades de deslocalizar a sua actividade para outras áreas”.

Carlos Lopes acrescenta que “a generalidade dos negócios do sector informal, mesmo daqueles que continuam a funcionar sob algumas restrições, como é o caso do comércio em alguns mercados e da venda ambulante, confronta-se com uma redução de clientes por causa da pandemia. O confinamento e o distanciamento social, associados à redução dos horários de funcionamento, impelem os clientes a evitar os mercados informais, sobretudo aqueles que registam maiores aglomerados populacionais. Pelo que a procura dos seus bens tem diminuido e os bens armazenados poderão ser desperdiçados”.

O especialista afirmou ainda que, “a montante, as empresas que abastecem o sector informal confrontam-se, dependendo do tempo que as medidas durarem, com maiores dificuldades e maiores custos de aprovisionamento, o que se tem reflectido no incremento do custo das mercadorias”.

Em suma, Carlos Lopes considera que, “em termos globais, o efeito imediato mais evidente tem sido a redução generalizada de rendimentos  e, em alguns casos, a privação total de obtenção de rendimentos (por exemplo, os mototaxistas), associada a uma acelerada perda do poder de compra face à desvalorização cambial e ao incremento do nível de preços, para o qual também contribui toda uma sorte de processos especulativos, desde os produtos alimentares, aos produtos farmacêuticos, aos gás, à água, aos transportes (como sucedeu na pausa a cerca sanitária entre as províncias durante os 4 dias autorizados para a deslocação para as províncias de origem)”.

Assim sendo, conclui, “os operadores, formais e  informais, que têm o poder de especular com as necessidades dos consumidores (por exemplo, os grossistas, os proprietários das cisternas de água) têm encontrado terreno fértil para a obtenção de rendimentos extraordinários, por força da incapacidade do Estado no controlo das margens máximas de comercialização, contribuindo para agravar os níveis de desigualdade. Naturalmente que também têm surgido iniciativas de reconversão de negócios adaptados ao contexto da crise (por exemplo, estilistas, alfaiates e costureiras que passaram a produzir máscaras) ou alguns operadores que, nas imediações dos centros de abastecimento e consumo, comercializam numa escala micro o uso de álcool  gel ou de sabão azul”.