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Quando o vício nasce no seio familiar

Cláudio Gomes
10/4/2020
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Foto:
Carlos Aguiar e DR

O álcool e as drogas constituem um sério problema de saúde pública e são um factor de desestruturação de famílias.

Nos últimos três anos, mais de 38.000 pessoas foram diagnosticadas como toxicodependentes, sendo a faixa etária mais afectada a dos 15 aos 49 anos, segundo dados do Ministério da Saúde revelados, em Fevereiro, na Assembleia Nacional, no âmbito da apresentação do “Movimento Nacional de Prevenção e Combate ao Uso de Drogas”, uma iniciativa do Grupo de Mulheres Parlamentares.

O sexo masculino é o mais afectado. No entanto, a maior preocupação das autoridades prende-se com o facto de, em muitos casos, a família ser um foco de má influência para as crianças num contexto em que se constata, no país, um consumo excessivo de álcool e outras drogas proibidas.

Dada a “magnitude do problema”, o Grupo de Mulheres Parlamentares da Assembleia Nacional considerou necessário tornar o grupo de trabalho contra as drogas mais abrangente, com “acções a serem implementadas em todo o território nacional”.

Entre outros objectivos, pretende-se contribuir com acções preventivas para a redução da incidência de casos relacionados com o uso e abuso de substâncias psicoactivas, actualização do acervo legislativo contra o uso de drogas, uniformização de uma resposta eficaz sobre o diagnóstico, tratamento, reabilitação e reinserção sócio-familiar dos toxicodependentes.

Uma “doença” silenciosa

No seu livro “Eventuais Causas e Consequências da Delinquência em Angola: Modelos de Delinquência, Volume I”, a psicóloga Maria da Encarnação Pimenta esmiúça o problema das drogas, afirmando que os pais alcoólicos têm quatro ou cinco vezes mais hipóteses de ter filhos alcoólicos do que os pais não alcoólicos.

No caso da família Nhanga, o ambiente conflituoso provocado pelos progenitores, serviu de impulso para que um dos filhos caísse na toxicodependência. “Eu e os meus irmãos sentimos-nos psicológica e profundamente afectados com a desintegração da nossa família, pelo facto de os nossos pais terem escolhido seguir caminhos diferentes”, lamenta Domingos Policarpo Nhanga, de 28 anos de idade, cujo irmão, Paulo Nhanga, enveredou precocemente para o consumo de drogas.

“Houve uma certa contribuição negativa dos meus pais no desencaminhamento do meu irmão. O meu pai tinha outra família e todos assistíamos constantemente a actos de violência verbal e física contra a nossa mãe”, desabafou.

Para Maria Encarnação Pimenta, apesar de muitos pais afirmarem que não têm nada que ver com o comportamento alcoólico dos filhos, sabe-se, no entanto, que a acção dos pais ou familiares que consomem constantemente álcool “aguça a curiosidade da criança em também experimentar”.

Segundo a especialista, o consumo de álcool entre os menores, dentro da família, dá-se quando os adultos “ousada e irresponsavelmente dão de beber aos indefesos. E aos poucos a criança vai-se habituando até entrar de verdade no mundo do alcoolismo e começar a evidenciar comportamentos anti-sociais”, frisou a também docente universitária. “Só a partir desse momento é que talvez os pais ou a sociedade se vão lembrar de que o indivíduo está psiquicamente afectado pelo álcool”, escreveu Maria da Encarnação Pimenta.

Para o caso da família Nhanga, tudo acontecia de forma silenciosa, sendo que os filhos recebiam uma educação religiosa que proibia o álcool. “Não notávamos que ele estava a enveredar para este caminho. Só quando atingiu os 15 anos é que começámos a dar razão à desconfiança do meu pai”, admitiu Dominhos Nhanga.